Inteligência Artificial é um meio e não um fim em si mesmo
O ChatGPT tornou mainstream um esforço de décadas para tornar a Inteligência Artificial parte do nosso dia a dia. Quando ele veio a público, usei intensamente a solução e, logo que tive a opção, fiz o upgrade para a versão paga do produto.
Passei muito tempo usando e me tornei um fã. Entretanto, seis meses depois deixei de usar a versão paga e hoje faço apenas consultas pontuais na ferramenta.
Qual será o motivo disso?
Muitos atribuem a diminuição do uso ao fato do ChatGPT entregar resultados muitas vezes duvidosos.
Eu não acredito nessa premissa, pessoalmente acho que o problema está em um lugar completamente diferente.
Para compartilhar meu ponto de vista, vou fazer uma pequena viagem no tempo e elucidar grandes inovações que tiveram adoção massiva.
Vamos começar com um dos maiores game changers da mobilidade, o carro. Antes dele, as pessoas levavam grandes quantidades de tempo para sair do ponto A até o ponto B. O carro otimizou uma das tarefas mais importantes da sociedade: a locomoção. Por esse motivo, o ritmo de vendas foi enorme e se transformou em um grande objeto de desejo.
Outro exemplo maravilhoso é o telefone, antes dele a comunicação era feita por cartas e portanto era muito demorado ter informações de parentes, trabalho ou qualquer caso de uso em geral. Assim como no exemplo do carro, essa inovação ajudou a sociedade a otimizar uma das suas necessidades mais básicas e ancestrais.
Nos dois casos apresentados, as inovações facilitaram e aprimoraram processos centrais para a vida dos seres humanos. Ao fazer isso de forma muito eficiente, acabaram tendo uma larga aceitação da sociedade.
Mas como isso se relaciona com a reflexão anterior sobre o ChatGPT?
Diferentemente das duas inovações citadas, o ChatGPT é muito mais abrangente nos seus casos de uso. Ele pode ser usado para uma gama infinita de atividade e processos. Nesse cenário o usuário é o protagonista e não o produto. Já no caso do carro e telefone o produto é o protagonista, as pessoas não precisam pensar muito para colher os múltiplos benefícios dessas soluções.
Na minha opinião a questão central está exatamente aí: para maximizar o poder da Inteligência Artificial, o usuário precisa assumir o controle e se perguntar quais processos e atividades precisam e poderiam ser otimizados pela tecnologia.
O desafio reside exatamente nesse aspecto, uma vez que no dia a dia é muito difícil ter reflexões abstratas sobre os processos que precisam ser otimizados. Por conta disso os casos de uso acabam se tornando extremamente simplórios e com pouco ou nenhum valor.
Mas o que isso tudo tem a ver com recrutamento?
Antes de mais nada, quero deixar claro que acredito muito na Inteligência Artificial. Mas, no que tange o recrutamento. ela está sendo usada de forma muito pobre e até mesmo perigosa.
Vamos olhar alguns exemplos:
IA para criação de job descriptions
Será mesmo que faz sentido criar descrições genéricas em um momento onde as pessoas candidatas exigem cada vez mais informações específicas e detalhadas para escolher se aplicam ou não para uma empresa. Além disso, qualquer empresa que usa um ATS tem uma infinidade de templates prontos e com um clique conseguem reutilizar job descriptions do passado.
Esse caso de uso é um excelente exemplo onde é super interessante ver a IA criando em realtime a descrição, mas na prática pouco valor é gerado.IA para criação de templates genéricos de devolutiva
Esse exemplo é muito próximo do anterior. Devolutivas genéricas são um dos maiores problemas apontados pelas pessoas candidatas, pedir uma devolutiva para o ChatGPT economiza bastante tempo, mas sem o input correto provavelmente os resultados vão ser inferiores ao que os times de recrutamento já têm como template no próprio ATSIA para triagem de talentos
Aqui a conversa começa a ficar muito interessante. Mão existe debate que a triagem talvez seja a atividade que mais consome tempo dos times de recrutamento, logo, usar IA nessa atividade traz ganhos de eficiência incontestáveis. Mas será que eficiência é o objetivo principal nesse caso? É preciso muita diligência para entender se a IA está otimizando o processo ou atrapalhando os times ao não priorizar os melhores candidatos. Além disso, para certas vagas a triagem pode funcionar; para outras, não. Isso sem falar da possibilidade de perpetuar vieses existentes. Dito tudo isso, não sou contra usar IA para triagem… o que sou contra é usar deliberadamente sem entender profundamente como funciona, quais são parâmetros e estar constantemente testando e refinando. Ou seja, você precisa estar em controle e não fechar os olhos e apenas confiar nos resultados.
Para finalizar o texto, vou compartilhar três processos onde a IA pode otimizar em muito a vida dos times de recrutamento
IA para construção de devolutivas personalizadas
O maior desafio para a personalização das devolutivas é centralização do input de todos os entrevistadores no processo. Esse por si só um desafio enorme, mas partindo do pressuposto que sua empresa tenha esse desafio resolvido, a IA pode ser uma grande parceira na redação de narrativas personalizadas levando em consideração todas as informações acumuladas durante o processo. Além disso, ela pode sugerir cursos, dicas e instruções de como a pessoa candidata pode evoluir.
IA para triagem de talentos
Mas calma, você não acabou de criticar agora pouco? Sim. Quero propor aqui uma nova forma de triar talentos. Na minha visão a pessoa recrutadora precisa ter o controle sobre o uso da IA, ou seja, ela definir os parâmetros e a IA ser uma co-pilota no processo.
Imagine que você tem 300 pessoas em uma vaga e você poder filtrar em linguagem natural dando o seguinte comando:
Me traga as pessoas que moram em São Paulo, trabalham atualmente como software engineers, tem experiência com startups e tem mais de 5 anos de experiência com Java.
Mágica, né?
Ciclo contínuo de melhoria no recrutamento
Esse é meu tema preferido e acho que IA pode colaborar muito aqui. Antes de mais nada, é necessário que exista uma integração sólida entre ATS e Avaliação de Desempenho aqui. Percebo que as job descriptions e requisitos das vagas são estáticas ao longo do tempo, essa reflexão é especialmente válida para vagas de esteira (posições que ficam perpetuamente abertas e tem um alto volume de contratações).
Os requisitos das vagas deveriam evoluir ao longo do tempo… Acredito que a inteligência artificial pode ser incrível em cruzar a avaliação das pessoas candidatas durante o processo com as avaliações de desempenho das pessoas contratadas e evoluir constantemente os requisitos da vaga, persona ideal, perguntas de qualificação, entrevistas etc… O futuro é logo ali : )
Espero que tenham gostado desse post e que gere um estímulo de pensar em processos com a ajuda de IA vs. IA como um fim em si mesmo.
Por hoje é só pessoal!
#growth #IA #recrutamento